Decisões políticas referentes a interligação energética causaram perdas de R$6,7 bi ao País

A política de integração energética entre os países da América Latina, bastante destacada pelo governo nos últimos anos e atualmente no foco da Eletrobras, foi alvo de duras críticas do Instituto Acende Brasil, centro de estudos voltado ao setor elétrico nacional. Nesta sexta-feira (24/9),  o órgão apresentou um documento no qual calcula os resultados das relações internacionais no campo da energia nos últimos anos. Nas contas dos especialistas do instituto, ao invés de gerar benefícios, a integração entre o Brasil e seus vizinhos levou o País a perdas de cerca de R$6,7 bilhões desde 2003. Os cálculos ainda apontam para possíveis impactos futuros que variam de R$9,5 bilhões a R$14,8 bilhões decorrentes dessas transações.

O relatório lista uma série de onze incidentes em que intervenções e pleitos dos países vizinhos levaram a alterações de condições originalmente pactuadas em contratos e tratados, sempre com ônus para os brasileiros. O instituto destaca que, nas relações internacionais, há sempre “riscos decorrentes do envolvimento de outras instituições” como governo, congresso, reguladores e grupos políticos ou econômicos sobre as negociações. E afirma que, na última década, a reação brasileira às pressões geradas nesse ambiente tem sido “bastante previsível e sempre baseada na ‘acomodação’ dos pleitos e intervenções de nossos vizinhos”. Para o Acende Brasil, as decisões do País acarretam “custos bilionários para consumidores, contribuintes e empresas brasileiras, sejam elas privadas ou estatais”.

A análise destaca que as mudanças nos acordos resultaram sempre de interferências políticas no processo, “seja por meio de alterações no regime regulatório-tributário, acordos diplomáticos, desapropriação de ativos pelo governo ou decretos de racionamento de energia”.

O primeiro caso citado pelo Acende Brasil para justificar sua posição é referente ao suprimento de gás pela argentina para o funcionamento da termelétrica AES Uruguaiana (640MW), em 2004. Os problemas no fornecimento do insumo levaram a prejuízos para a AES e na paralisação da usina, que hoje está desligada por tempo indefinido. Nesse caso, estima-se uma perda de R$1,6 bilhão, contando-se a inutilização da planta e do gasoduto e o aumento do imposto de exportação do gás.

A relação com a Argentina também causaria, segundo a análise do instututo, impactos negativos ao País em acordos para intercâmbios de energia assinados entre o país vizinho e o Brasil. De acordo com o relatório, os brasileiros não teriam obtido nenhuma vantagem com o acordo, que teria só beneficiado os argentinos. Além disso, o texto indica que o envio de energia hidrelétrica para o país vizinho pode ter aumentado os custos de geração térmica no Brasil, uma vez que, em 2008, não houve sobra de água nos reservatórios.

Já na Bolívia, o governo de Evo Morales, ao nacionalizar as reservas de petróleo e gás do país, quebrando contratos com a Petrobras e com a Termocuiabá, que recebia o insumo do país, também teria levado a prejuízos no Brasil. O impacto para a Petrobras teria sido negativo em R$158 milhões. E, para a termelétrica de Cuiabá, de R$171 milhões pela indisponibilidade do gás e de R$1,3 bilhão pela paralisação das atividades da planta, que ficou inutilizada, e de seu respectivo gasoduto.

Outro incidente é na relação com a Venezuela. Com a crise de fornecimento de energia no país, que enfrentou até mesmo um racionamento, houve dificuldades para o envio de energia a Roraima. O Estado, que era abastecido pelos venezuelanos, sofreu redução na carga recebida, o que obrigou o Ministério de Minas e Energia à contratação emergencial de energia e à geração térmica, com os custos sendo bancados pela Conta de Consumo de Combustíveis (CCC). Esta, por sua vez, tem recursos provenientes de encargo cobrado de todos consumidores brasileiros.

Por último, o Acende Brasil debruça-se sobre alterações já feitas e outras ainda em discussão referentes à hidrelétrica binacional Itaipu, construída por Brasil e Paraguai. A questão recebe um capítulo à parte, em que os especialistas do instituto apontam diversas distorções que teriam dado vantagens ao país vizinho e custos desnecessários ao Brasil. Neste ponto, o estudo vê perdas de R$1,14 bilhão já assumidos pelo País.

Ainda em sua análise sobre Itaipu, o órgão alerta para o novo tratado referente à hidrelétrica, que espera a aprovação do Congresso brasileiro. No texto, o presidente Lula autoriza o aumento dos pagamentos pela energia elétrica da usina, que triplicariam. Também está prevista a construção de uma linha de transmissão no lado paraguaio do empreendimento, com custo totalmente bancado pelo Brasil. “Trata-se de um investimento que irá beneficiar exclusivamente o consumidor de energia elétrica no Paraguai. Neste sentido, é incoerente que o consumidor de energia elétrica brasileiro e a Itaipu Binacional sejam onerados com esta obra”, critica o Acende Brasil. A obra está estimada em US$400 milhões.

Por fim, o centro de estudos afirma que as decisões tomadas pelo governo “distorcem todo o planejamento do setor energético” e “encarecem o fornecimento de energia para consumidores e empresas brasileiras”, ao aceitar as condições impostas pelos países vizinhos, sempre onerosas ao Brasil. O Acende Brasil também afirma que as medidas “minam a credibilidade e a segurança necessária para o engajamento em novos empreendimentos de integração energética” devido aos riscos políticos que envolveriam os novos negócios.

Fonte: Jornal da Energia

Paulo Ribeiro