Ônibus de Itaipu: o começo de uma revolução

Por Jayme Buarque de Hollanda * – Durante a “40ª Cúpula de Presidentes do Mercosul” em 15 de dezembro último, presidentes de 12 países-membros circularam em um ônibus elétrico híbrido a etanol desenvolvido por Itaipu como parte de iniciativas da empresa para desenvolver veículos elétricos. O ônibus tem a placa número “1” do Mercosul e a iniciativa da binacional vai muito além, podendo representar um primeiro passo de grande importância estratégica para o etanol.

Recordando, quando o Brasil lançou o Proalcool para substituir a gasolina, o governo foi questionado sobre se não teria sido melhor destinar o etanol para substituir o diesel. Afinal, este combustível, usado para acionar sobretudo veículos pesados, tem destinação estratégica, pois é vital para os transportes públicos e para a circulação de bens e produtos em rodovia neste país de dimensões continentais.

A opção por substituir a gasolina atendeu à necessidade de reduzir o risco tecnológico e econômico do programa; havia uma grande experiência acumulada no uso de etanol em motores a gasolina (ciclo Otto), mas o seu uso em motores de ciclo Diesel ainda dependeria de um extenso trabalho de P&D. Adicionalmente, a alternativa de reajuste do refino do petróleo, aumentando a fração do diesel, era mais viável e econômica naquele momento.

A decisão se mostrou acertada, pois não impedia o uso futuro do etanol em veículos pesados quando a tecnologia fosse dominada. A partir de então, várias experiências foram feitas, e continuam até o presente, em universidades, centros de tecnologia e empresas privadas para criar aditivos ao etanol e/ou adaptar motores diesel e/ou para usar o etanol em motor diesel. Ainda agora, apenas experiências limitadas de poucos fabricante estão em curso.

A arquitetura do veículo elétrico híbrido (VEH) abre uma nova possibilidade para obter o mesmo efeito. Nesses veículos, as rodas são acionadas por motores elétricos e usam energia de um grupo gerador instalado a bordo. Não se trata de uma novidade: no começo do século XX, a Porsche usou esse acionamento em carros leves e, durante a primeira guerra, fabricou um caminhão para transportar 100 toneladas.

No VEH a potência do motor de combustão interna pode ser bem menor que no veículo convencional correspondente (da ordem de metade a um terço), pois parte da energia que gera é estocada em baterias que fornecem a energia nas horas em que o veículo precisa de mais potência. Dessa forma, é possível usar motores do ciclo Otto, a etanol, como foi feito no novo ônibus de Itaipu.

O VEH a etanol abre um novo espaço para começar o processo de substituição do diesel pelo etanol em prazo relativamente curto. A ênfase inicial deve ser nos usos urbanos onde ônibus, caminhões de entrega e outros veículos pesados se deslocam em um regime “arranca-pára”, onde a performance do VEH serial é particularmente elevada e onde ele evita a emissão dos gases de escape do diesel, uma das principais fontes de emissões urbanas indesejáveis. Estes tipos de veículos não são feitos em série, o que facilita a introdução da nova arquitetura que reúne tecnologias dominadas.

Seria pouco provável que soluções surjam junto às produtoras tradicionais de veículos, cujas linhas de fabricação, normalmente, são ditadas pelas matrizes e que pouco se interessariam por uma questão de aplicação eminentemente brasileira (curiosamente uma fabricante já testa ônibus elétrico híbrido a etanol na Suécia há anos, mas nunca o demonstrou no Brasil). Assim, é de se louvar a iniciativa da Itaipu.

De todos os potenciais interessados na substituição do diesel pelo etanol, o setor sucroalcooleiro parece reunir condições únicas para obter bons resultados. Deveriam botar o olho nessa bola por, pelo menos, duas razões. A primeira, naturalmente, seria fomentar a criação de um novo e importante mercado para o etanol. A segunda seria substituir por etanol, produzido na própria usina, o diesel usado nas máquinas agrícolas e no transporte da cana no campo (640 milhões de toneladas em 2010), com tecnologia VEH. Como a logística se faz em baixas velocidades, distâncias curtas e regime “arranca-pára”, muito parecido com o tráfego urbano, é possível usar a tecnologia de Itaipu. Caminhões usando essa tecnologia permitirão ainda, quando o preço das baterias for menor, usar a energia elétrica produzida nas usinas. Essas providências tornarão o etanol mais verde com a redução de sua dependência dos combustíveis fósseis.

Fonte: Ambiente Energia