O Brasil vai virar gastador de energia?
Até agora, com uma tarifa entre as mais caras do mundo, o Brasil foi razoavelmente econômico no consumo de energia. Mas o plano do governo, e desejo de todos, é baratear a eletricidade. Não podemos começar a desperdiçá-la.
Uma boa forma de avaliar a eficiência com que se trabalha num país é medir quanto de energia se gasta para produzir algo. Nos últimos tempos, entre os países que brilham nesse critério estão nossos vizinhos em ascensão, Peru e Colômbia, a ultra-competitiva cidade-estado de Cingapura e as potências europeias Reino Unido e Alemanha. Todos gastam relativamente pouca energia – seja qual for a fonte – para produzir relativamente muito. Na outra ponta, entre as nações que gastam energia demais para produzir relativamente pouco, figuram grandes emergentes como Rússia, China, Indonésia e África do Sul, além da Venezuela. O Brasil vem num honroso pelotão intermediário, ladeado por Japão e França e melhor que os Estados Unidos. Melhorar a eficiência é importante sempre. Um país mais eficiente no uso dos recursos polui menos, cresce melhor e gera excedentes para aumentar salários. O tema ganha especial relevância neste momento, em que o governo estuda medidas para baratear a energia.
Percebe-se no mundo uma relação clara e cruel: quanto mais barata é a energia, mais ela é desperdiçada. Onde a tarifa energética para a indústria se mostra mais cara, a eficiência produtiva também é maior. Entre as nações que pagam pouco pela eletricidade e a aproveitam mal, aparecem Rússia, China, Argentina e Estados Unidos (em todos, a tarifa industrial é inferior ao equivalente a R$ 170 por MWh, e todos produzem menos de US$ 8 de PIB ao consumir energia equivalente a 1 kg de petróleo. Rússia e China não produzem nem US$ 4 com esse “quilo de petróleo”, um aproveitamento baixíssimo). Entre os países que pagam muito pela energia e a aproveitam muito bem estão Colômbia, Chile, Reino Unido e Alemanha (em todos, a tarifa industrial é superior ao equivalente a R$ 190 por MWh, e todos geram mais de US$ 8 de PIB ao usar o equivalente a 1 kg de petróleo). O Brasil, hoje, está no meio do caminho, com energia cara e aproveitamento razoável (tarifa industrial de R$ 390/MWh, produção de US$ 7,60 por “quilo de petróleo” usado). Temos de evitar que essa relação mude para pior.
Até o final de agosto, o governo deverá tomar uma decisão importante no que se refere ao sistema energético brasileiro. Em 2015, vencerão 112 dos 196 contratos de concessão de energia no Brasil e ainda é preciso decidir de eles serão renovados ou não. E 2015 não está longe. Para o setor de infraestrutura, isso significa amanhã. Os preços poderiam cair por pressão do governo federal sobre as empresas do setor (a pior solução) ou por aumento da concorrência no setor (a melhor). Em qualquer dos casos, é desejável que haja corte de impostos.
Atualmente, o Brasil está entre os dez países com a eletricidade mais cara do mundo, superado principalmente por países europeus ricos e gelados. Em outros países em desenvolvimento, as famílias e empresas pagam menos pela eletricidade. Mesmo assim, conseguimos manter os gastos dentro de limites razoáveis, segundo um levantamento do do professor Alcides Leite, da Trevisan Escola de Negócios. Para produzir o mesmo, gastamos menos dinheiro com energia que os desenvolvidos Estados Unidos e Canadá. Também gastamos menos que outros grandes países em desenvolvimento, como México e Turquia (isso não quer dizer que sejamos eficientes na produção de forma geral – se incluirmos na conta outros fatores, como a educação e qualificação dos trabalhadores e o uso de tecnologia, vemos que a produtividade brasileira é baixa e vem crescendo muito vagarosamente).
Somos razoavelmente eficientes no uso de energia até agora, e ainda por cima usamos fontes mais limpas que a maioria dos países. Por isso, temos de ficar atentos aos efeitos de a energia se tornar, no Brasil, relativamente mais barata. Não queremos nos tornar uma nação de perdulários de eletricidade.
O preço da energia vai cair mesmo?
Segundo dados da Firjan, para que possamos sentir mesmo os efeitos do barateamento da energia na nossa vida, seria necessário reduzir em pelo menos 35% o custo da energia para a indústria. Isso não será tão simples. Cristiano Prado, gerente de competitividade da Firjan, diz que o sistema brasileiro é tecnologicamente atualizado. Se queremos que ele continue assim e se torne mais seguro, ele exige investimentos. Outras escolhas têm preço. Ao longo de anos, o Brasil deu prioridade a usinas hidrelétricas com menor impacto ambiental, as chamadas usinas de fio d’agua. Elas alagam menos, mas também produzem menos energia – ou seja, tornam-se relativamente mais caras.
Fonte: Revista Época