“Kit geladeira” reduz conta de energia em até 15%
Uma simples geladeira é responsável por cerca de 30% dos gastos mensais das famílias brasileiras com energia elétrica.
Mas Mirko Chávez Gutiérrez e Vivaldo Silveira Júnior, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), acreditam estar no caminho certo para diminuir esse impacto.
Eles desenvolveram um “kit geladeira” que, no estágio atual, já é capaz de economizar até 15% na conta de energia.
Condensador evaporativo
Os dois engenheiros criaram um dispositivo para a condensação evaporativa em refrigeradores domésticos. Os condensadores evaporativos são apenas utilizados atualmente em sistemas de refrigeração de maior porte, como por exemplo em câmaras frigoríficas.
O kit geladeira é composto basicamente de um reservatório, de uma pequena bomba hidráulica e de um tubo de PVC, para a circulação e a distribuição de água que se condensa no exterior do refrigerador.
“O reservatório precisa se encaixar à recepção da água que está caindo, a fim de que possa ser bombeada novamente”, diz Vivaldo.
Kit geladeira
Dependendo do interesse das empresas montadoras, o kit será facilmente implementado a um baixo custo e com a eficiência que o Brasil requer, afirma Silveira Júnior.
Ele considera que, se o dispositivo for levado à escala comercial, poderá se tornar mais adaptável e ganhar um design arrojado que acomodará melhor o sistema externo, embora já hoje, a partir desta pesquisa, possa ser aplicado a qualquer refrigerador, mesmo os mais antigos.
Com base nos dados obtidos com o protótipo, a economia no consumo global de energia elétrica residencial – em termos nacionais – chegaria a um patamar de 5%. “O resultado seria mais encorajador do que o obtido no horário de verão, que fica ao redor de 1%”, relembra.
Vilões do consumo de energia
Gutiérrez centrou seu projeto na geladeira porque ela é utilizada por 96% das famílias brasileiras e é uma das vilãs no consumo de energia elétrica (o chuveiro ainda figura como o primeiro colocado).
Segundo o pesquisador, existem no Brasil poucas iniciativas efetivas que visem à economia energética nestes equipamentos.
O condensador evaporativo, ao contrário, provou ser uma estratégia viável, pois a tecnologia já era empregada com sucesso na indústria, ainda que sem aplicações domésticas.
Durante os testes, utilizaram-se diferentes condições de temperatura de ensaios para todas as regiões do país. Foram feitos experimentos em temperaturas ambientais baixas, como acontece no Sul (17 e 18ºC), e em temperaturas altas (32ºC), como no Nordeste. O equipamento mostrou-se eficientemente, de acordo com o pesquisador, em todos os arranjos de temperaturas.
Funcionamento do condensador
Na prática, esse condensador evaporativo promove a transferência de calor para a água de resfriamento.
A sua função é transferir calor do gás circulando por dentro dos tubos do sistema de refrigeração para a água, que os molham no lado externo. “Quisemos, portanto, aliar esta necessidade a uma tecnologia que possui uma aplicação industrial já atestada,” destaca o engenheiro.
“Escolhemos uma geladeira antiga porque é certo que o seu consumo será maior. Foi uma forma de testar o experimento na pior situação”, conta, mas reconhece que, quanto mais passa o tempo, as montadoras têm melhorado o sistema de refrigeração e de isolamento dos novos refrigeradores. “O nosso trabalho inclusive ajudaria muito nesse processo”, sinaliza Gutiérrez.
Essa técnica adaptada deve “cair nas graças” da indústria, na avaliação do pesquisador, justamente por este favorecimento da água em promover a troca térmica neste local, onde de fato precisa haver dissipação de calor para adequar o ciclo termodinâmico da geladeira.
Para facilitar a sua dissipação, a água é circulada sobre o condensador. Ela evapora e troca calor mais facilmente neste local. Este favorecimento do sistema de refrigeração da geladeira como um todo mantém internamente sua operação normal e com melhor eficiência durante a troca térmica.
“Conseguimos inovar em termos de aplicação. Falta agora buscar uma parceria com alguma empresa que se interesse pela proposta, como as grandes fabricantes de refrigeradores. Seria uma contribuição para a eficiência energética, já que no momento precisamos encontrar meios de economizar energia e realizar o mesmo trabalho. A isso chamo eficiência energética”, diz Silveira Júnior.
Tecnologia social
Ainda que esse dispositivo tenha um custo, ele foi concebido para atender a uma demanda social. “Não queríamos que o custo fosse elevado. O investimento inicial no kit é de apenas R$ 40,00 aproximadamente, por equipamento. Considerando que é uma tecnologia inovadora e de fácil aplicação, nota-se que ela tem tudo para impactar positivamente a comunidade em geral com o apelo de conseguir uma melhora do desempenho energético e de gerar uma poupança em famílias de qualquer parte do Brasil.”
Agora a ideia dos engenheiros é combinar outros benefícios com este dispositivo em refrigeradores. “O sistema oscila menos e o compressor enfrenta menor tempo de parada e de partida. Além disso, mesmo do ponto de vista dos alimentos e de sua conservação, ele é desejável para manter uma temperatura mais uniforme dentro do gabinete da geladeira”, comenta Gutiérrez. Pelo fato de ter uma temperatura com menores oscilações, os alimentos na geladeira alcançam um maior tempo de conservação.
Quanto à melhora de desempenho do sistema de refrigeração, foram efetuados cálculos para entender o que significam esses 15% que, à primeira vista, não dão a sua dimensão exata.
Contudo, levando em conta um custo de tarifa de R$ 0,331/kWh, que normalmente é a tarifa praticada pelas concessionárias de energia, ele representaria uma economia financeira mensal de R$23,44, segundo testes comparativos desenvolvidos com um refrigerador com e sem o dispositivo proposto.
“É uma economia considerável para uma conta residencial. Trata-se de um serviço de utilidade pública e uma forma de economizar energia de maneira eficiente”, expõe o pesquisador. Soma-se a isso a vantagem de o sistema trabalhar sem exigir grandes modificações no seu funcionamento.
Segundo o autor da pesquisa, o governo brasileiro não tem sido omisso em buscar maneiras de melhorar a eficiência energética. Contudo suas estratégias atuais baseiam-se na troca de refrigeradores.
“As concessionárias trocam os refrigeradores mais antigos, devido ao seu maior consumo em relação aos atuais. Esta estratégia é apenas uma substituição”, afirma. “Se alcançarmos a massificação do dispositivo estudado, será uma estratégia mais agressiva do que apenas substituir um equipamento por outro, sendo que este procedimento pode representar novos problemas ambientais. A nossa contribuição poderia ser maior neste caso.”
Aprimoramentos necessários
Um inconveniente do dispositivo é que a dona de casa terá que preencher o reservatório de água todos os dias, para que funcione, já que ela se evapora a cada 24 horas aproximadamente. Manter a circulação da água e a sua evaporação são os benefícios que se colocam neste trabalho.
Por outro lado, o condensador da geladeira, que é o lugar mais quente do aparelho, realça Silveira Júnior, também será o mais úmido, neste caso. Por este motivo, o local pode se tornar um foco para o desenvolvimento de bactérias e de algas. Uma saída, aconselha, é realizar o tratamento químico da água. “Ela tem que estar isenta de sujeiras, exigindo-se um tratamento químico com algum bactericida que permita promover a sua circulação”, aponta.
O tratamento químico da água utilizada no dispositivo deve ser mantido com índices por volta de 5ppm (parte por milhão) de cloro, por exemplo. “Os tratamentos disponíveis não encarecem o custo do dispositivo e, mais que isso, são necessários. Porém, frente ao bônus que ele proporciona, a despesa é baixa e não limita a sua aquisição pelas famílias”, defende Gutiérrez.
Fonte: Inovação Tecnológica