Prédio com ‘energia zero’
Os edifícios residenciais, comerciais e públicos são responsáveis por aproximadamente 47% de toda a eletricidade consumida no país, conforme relatório do Ministério de Minas e Energia e da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), instituições do governo federal. O dado é um dos fundamentos de estudo conduzido na Unicamp pelo engenheiro de controle e automação Bruno Wilmer Fontes Lima.
O pesquisador da Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM) acaba de propor metodologia para desenvolvimento de sistema de geração de energia que permitirá a esses prédios a produção de toda a eletricidade consumida por eles. O projeto utilizaria fontes renováveis, principalmente, painéis solares fotovoltaicos – dispositivos responsáveis pela captação e transformação da energia solar em elétrica. O estudo integra mestrado apresentado por Bruno Lima ao Programa de Pós-Graduação em Planejamento de Sistemas Energéticos da FEM.
“A ideia surgiu com esta nova tendência de edificações que podem gerar a própria eletricidade que consomem. Isso vem sendo implantado em alguns países da Europa, no Japão e nos Estados Unidos. Nestes países já existem legislações obrigando, a partir de 2020, que prédios públicos sejam edifícios de energia zero, isto é, prédios que, ao longo do ano, gerem toda a eletricidade que consomem a partir de fontes renováveis”, conceitua o estudioso.
De acordo com ele, sua pesquisa objetiva, em especial, auxiliar engenheiros e arquitetos no dimensionamento de sistemas de energia zero, permitindo maior adoção deste tipo de edificação no país. O engenheiro revela que esta metodologia será aplicada, inclusive, em um laboratório de ensino e pesquisa da Unicamp, cujo projeto já está em andamento. O edifício para abrigar o laboratório deverá ser construído nas instalações da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC).
“A meta do projeto, desenvolvido em parceria com a CPFL [Companhia Paulista de Força e Luz], é ter o menor impacto ambiental durante sua construção e operação, além de tornar o prédio um edifício de energia zero. O laboratório contará com aproximadamente 600 metros quadrados e será integralmente instrumentado e monitorado, de modo a ser utilizado para futuras pesquisas nesta área”, informa o pesquisador.
O docente do Departamento de Energia da FEM, Gilberto de Martino Jannuzzi, orientou a dissertação. Já o projeto para a construção do laboratório da Unicamp, que deverá ser um dos primeiros edifícios de energia zero do país, é coordenado pela professora Vanessa Gomes da Silva, do Departamento de Arquitetura e Construção da FEC. O estudo de Bruno Lima obteve financiamento da CPFL, por meio de convênio com o Departamento de Pesquisa e Desenvolvimento da instituição.
Viabilidade – Ecologicamente corretos, os edifícios de energia zero também podem ser viáveis do ponto de vista econômico. O engenheiro e estudioso da Unicamp afirma ter efetuado cálculos demonstrando que, em aproximadamente 15 anos, os custos com a implementação e manutenção do sistema são pagos com a economia de energia obtida.
“O edifício de energia zero é mais caro que um prédio convencional, principalmente, devido ao acréscimo de custo para instalação do sistema de geração de energia. Mas os valores vêm diminuindo. É importante que estas tecnologias e conceitos tornem-se viáveis, pois só assim se popularizarão. Mas, infelizmente, ainda existem obstáculos no Brasil. O primeiro é que quem investe na construção do edifício, geralmente, não é aquele que vai pagar a conta de eletricidade. Outro problema é que, normalmente, a tomada de decisão não é feita sob uma visão de longo prazo”, destaca Bruno Lima.
Para o orientador do trabalho, o docente Gilberto de Martino Jannuzzi, uma série de fatores tem permitido o desenvolvimento de projetos renováveis e viáveis economicamente. Ele cita “o avanço das tecnologias de geração descentralizada de energia, a integração com edifícios e o conhecimento sobre as possibilidades de eficiência energética”.
A geração distribuída de eletricidade, de acordo com Gilberto Jannuzzi, é aquela produzida próxima ou no próprio local de consumo. “A sua utilização a partir de fontes renováveis pode atender parte da crescente demanda por energia no país, evitando, por exemplo, a construção de novas hidrelétricas e termelétricas; e reduzindo os impactos socioambientais”, esclarece o orientador, que atua como pesquisador do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Nipe) da Unicamp.
Compensação – Recentemente, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) baixou uma norma que deve estimular a implementação de projetos mais eficientes no país, como os dos edifícios de energia zero. Aprovada em abril deste ano, a resolução cria um sistema de compensação de energia. Ele permite que proprietários de geração distribuída de eletricidade, como seriam os donos de edifícios de energia zero, possam injetar o excedente da eletricidade não consumida na rede de distribuição.
A distribuidora, por sua vez, utilizaria este excedente como crédito para abater do consumo de eletricidade. Essa situação ocorreria, por exemplo, em momentos em que o sistema não fosse capaz de produzir energia suficiente, como nos horários de pico ou em períodos noturnos, quando os sistemas de energia solar não funcionam.
“Esta resolução possibilita certa viabilidade para os edifícios de energia zero no Brasil. Ela permite redução de custos porque dispensa a utilização de uma bateria para o sistema poder armazenar o excedente da eletricidade. O sistema com a bateria é mais caro do ponto de vista da manutenção e tem um impacto ambiental muito maior que os sistemas sem baterias. É assim que funciona na Europa e nos EUA”, explica Bruno Lima.
Etapas – A metodologia proposta pelo pesquisador da Unicamp consiste em etapas simples que incluem análises sobre o consumo de energia do edifício e sobre o potencial energético local. Ele cita como exemplo a cidade de Campinas, cujo potencial foi analisado com base em dados do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura (Cepagri) da Unicamp.
“Os indicadores do Cepagri demonstram que o potencial eólico da região não é muito forte. A velocidade média anual do vento é muito reduzida, abaixo de 2 metros por segundo. Para uma geração eólica boa são necessários ventos com uma média anual acima de 5,5 metros por segundo, de acordo com estudos de especialistas da área. Por outro lado, o potencial solar da região é muito relevante”, detalha.
O estudo propõe ainda o dimensionamento e a simulação do sistema de geração, concluindo com a avaliação dos resultados para averiguar se a energia gerada seria suficiente para classificar o edifício como zero. “Indicamos também ferramentas para auxiliar na escolha de um sistema dentre diversas opções de arranjos e tecnologias, bem como o seu custo, o da eletricidade produzida por ele e o tempo de retorno de energia”, esclarece.
Solstício Energia – Após a conclusão do mestrado, o engenheiro Bruno Lima irá se dedicar às atividades da Solstício Energia, empresa recém-incubada por ele e mais um grupo de amigos na Incubadora de Empresas de Base Tecnológica (Incamp) da Agência de Inovação Inova Unicamp. “O empreendimento irá desenvolver projetos fotovoltaicos e, principalmente, buscar alternativas para tornar esta fonte de energia mais acessível à população com a redução de custos”, divulga.
Publicação
Dissertação: “Geração distribuída aplicada a edificações: edifícios de energia zero e o caso do Laboratório de Ensino da FEC-Unicamp”
Unidade: Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM)
Autor: Bruno Wilmer Fontes Lima
Orientador: Gilberto de Martino Jannuzzi
Financiamento: CPFL
Fonte: Ambiente Energia