A tragédia em Mariana pode afetar o mercado global do minério?
O rompimento da barragem de Mariana, em Minas Gerais, pode ter um impacto significativo no mercado global de minério de ferro?
A pergunta divide analistas do setor, que têm tentando entender qual serão as consequências do acidente para as mineradoras responsáveis pela barragem e a produção da região.
A barragem foi construída pela Samarco, um consórcio entre a brasileira Vale e a anglo-australiana BHP Billiton, duas das três maiores mineradoras do mundo (a terceira é a também anglo-australiana Rio Tinto).
Em função da tragédia, as ações da BHP chegaram a seu nível mais baixo em sete anos na bolsa australiana nesta segunda-feira enquanto as da Vale, que já haviam fechado a sexta-feira com queda superior a 7%, caíram mais 1,4% em São Paulo.
A BHP também já anunciou que está revisando sua meta de produção para 2016. O presidente-executivo da empresa, Andrew Mackenzie, e o diretor dos negócios de minério de ferro, Jimmy Wilson, devem vir ao Brasil para avaliar como contribuir na resposta a tragédia.
Na última semana, alguns bancos e consultorias de investimento divulgaram estimativas prevendo que o acidente pode afetar o preço do minério no mercado internacional, além dos projetos e resultados dessas duas companhias.
Preços
O Deutsche Bank, por exemplo, ressaltou que a Samarco responde por 2% da produção de minério de ferro comercializada entre países e prevê que os preços poderão subir em 2016, principalmente se o acidente levantar dúvidas sobre outros projetos da Vale no Brasil.
O Citi também revisou sua previsão para o valor do produto para o final do ano, de US$ 40 para US$ 50, após o acidente, prevendo uma redução no ritmo da produção brasileira.
A lógica é que, com uma queda da oferta, os preços – que vinham caindo em função do desaquecimento da China e da abertura de novas áreas de produção – podem ter uma leve recuperação.
Mas para José Mendes, presidente da consultoria mineira JMendes e ex-presidente do Instituto Brasileiro de Mineração, essas estimativas podem estar superestimadas e é muito cedo para fazer qualquer análise sobre como o mercado da mineração será afetado.
“A mineração não tem a mesma velocidade de reação de outros tipos de mercado, então qualquer avaliação feita agora vai ser prematura”, diz o consultor.
“Já faz algum tempo que eu estimo que os preços se recuperarão para a faixa dos US$ 50, mas isso em função de outras dinâmicas do mercado. O acidente não deve ter um impacto significativo, até porque a produção local é relativamente pequena.”
Multas
Ricardo Kim, analista-chefe da XP Investimentos, concorda. Ele nota que a Samarco era responsável por 20% da produção global de pelotas de minério, um subproduto do minério de ferro. “Mas seu peso no mercado de minérios como um todo não é importante. Tanto que nos últimos dias o preço do produto se alterou pouco”, diz ele.
Para Kim, porém, é esperado que as empresas envolvidas na tragédia tenham problemas, “não tanto pela paralisação da produção, mas principalmente pela aplicação de multas e sanções, que a essa altura ainda é difícil de se estimar”.
Em 2014, a Samarco representou menos de 4% da produção total da Vale e cerca de 6% da produção da BHP. Também respondeu por cerca de 3% da receita total da anglo-holandesa, segundo cálculos de consultores de investimentos.
O Banco UBS esperava que o consórcio tivesse um lucro prévio ao pagamento de juros e impostos (o que no jargão financeiro é chamado de Ebitda) de US$ 189 até junho – cerca de 3% do lucro da anglo-holandesa.
Kim considera esse percentual pouco expressivo. “Não chega a ser importante para a companhia. No caso da BHP, as questões que realmente podem ter um impacto são mesmo possíveis multas e sanções e os desdobramentos da tragédia, cuja escala sequer pode ser estimada”, diz o analista da XP.
“Vale lembrar que a Samarco é multinacional, tem vida própria e deve responder pelos fatores que serão apontados. E é muito cedo para afirmar quais serão as implicações para a Vale”, opina Pedro Galdi, analista de investimento da Whatscall Consultoria.
“Só saberemos (o impacto do acidente) após averiguações do número exato de vítimas, indenizações, risco de licenças, etc.”
Imagem
Para Galdi, no caso da Vale, o impacto do acidente “não será financeiro, apesar de ainda não se saber se os seguros cobrem os processos que a Samarco irá sofrer, nem tampouco as questões de penalizações ambientais”.
“Vejo para a Vale mais como uma questão de imagem”, diz ele.
Nesta segunda-feira, o Governo de Minas Gerais embargou as atividades da Samarco na região de Mariana.
A empresa só poderá retomar seus trabalhos no local após a apuração e a adoção de medidas de reparo dos danos provocados pelo rompimento da barragem.
Entre analistas, há quem aposte que a mina da Samarco em Mariana possa ter de ficar fechada por anos.
Para o Deutsche Bank, por exemplo, ela só voltará a produzir em 2019 e os custos para reparar os estragos do desastre – que precisarão ser divididos entre Vale e BHP – podem chegar a US$ 1 bilhão.
Mendo discorda: “É muito tempo. Até 2019, poderíamos construir uma mina nova”, diz.
Fonte: BBC-Brasil