Especial: 50 anos da Lei de Moore
Em 19 de abril de 1965, há pouco mais de 50 anos, Gordon Moore, na época chefe de pesquisa da Fairchild Semiconductor e posteriormente um dos cofundadores da Intel, foi convidado pela “Electronics Magazine” para escrever um artigo prevendo o que aconteceria aos circuitos integrados, o coração da computação, nos próximos 10 anos. Estudando a tendência que viu nos anos anteriores, Moore previu que a cada ano nós dobraríamos o número de transistores presentes em um único chip de silício, de modo que teríamos o dobro do poder de computação por apenas ligeiramente mais dinheiro. Quando isso se concretizou em 1975, ele modificou sua previsão para o dobro a cada dois anos. A “Lei de Moore” basicamente foi mantida desde então –e, apesar dos céticos, ela persiste, a tornando provavelmente o exemplo mais notável de crescimento exponencial sustentado de uma tecnologia.
De lá para cá, a Lei de Moore possibilitou o avanço de todos os tipos de tecnologia. Um exemplo são os computadores, basta comparar com o que foi considerado um supercomputador: o Cray-1. Lançado em 1976, ele poderia fazer 160 milhões de operações de ponto flutuante por segundo (160 megaflops) com 8 megabytes de memória. Para comparação, a GPU do PS4 sozinha já está na casa dos teraflops, que equivale a 1 milhão de megaflops. Qualquer computador básico já supera de longe o Cray-1 em cálculos por segundo e em quantidade de memória ocupando muito menos espaço.
Cray-1, um dos primeiros supercomputadores da história.
E isso se aplica a celulares, por exemplo, o DynaTAC criado em 1975, tinha 25 cm de comprimento, 7 cm de largura, pesava 794 gramas e sua bateria durava míseros 20 minutos. Hoje, os celulares são sensíveis ao toque, inteligentes, mais finos e leves. Aos chips usados em objetos domésticos inteligentes, tecnologia vestível e tudo mais. Facilita a difusão da internet e da informação, também.
O primeiro celular, o Dynatec criado em 1975, tinha 25 cm de comprimeiro, 7 cm de largura e pesava 794 gramas.
O que mais chama atenção no artigo de Moore de 1965 é quantas previsões ele acertou sobre o que a melhora constante dos microchips proporcionaria. O artigo, intitulado “Agrupando Mais Componentes em Circuitos Integrados”, argumentava que: “Os circuitos integrados levarão a maravilhas como computadores domésticos –-ou no mínimo terminais conectados a um computador central-– controles automáticos para automóveis, equipamento de comunicação portátil pessoal. O relógio de pulso eletrônico precisa apenas de um display para ser viável hoje. (…) Nas comunicações por telefone, os circuitos integrados em filtros digitais separarão canais no equipamento multiplexador. (Eles) também controlarão as ligações e realizarão processamento de dados”.
Há o questionamento se a Lei de Moore ainda continua em vigência e por quanto mais tempo ela continuará se mantendo. Claro que a evolução da tecnologia não vai parar, mas o ritmo pode mudar tanto para cima quanto para baixo. As empresas podem considerar que o investimento para manter este ritmo é muito alto e não compensa mais; ao mesmo tempo, a competitividade pela inovação pode fazer acelerar este ritmo, alavancando o investimento.
Existe também o problema da física: por quanto mais tempo será possível continuar reduzindo os transistores e implantando em seus chips? A Intel já prevê que o silício não será mais usado em seus processadores de 7 nanômetros, previstos para 2017. A mudança de materiais, a evolução da nanotecnologia são fatores que podem chacoalhar a indústria e colocar a Lei de Moore no passado.
“Para o 50º aniversário da Lei de Moore, Thomas L. Friedman entrevistou Moore, atualmente com 86 anos, no Exploratorium em São Francisco, em uma celebração em sua homenagem realizada pela Fundação Gordon e Betty Moore e pela Intel. Thomas L. Friedman perguntou a ele o que ele aprendeu com o fato da Lei de Moore ter durado tanto.
“Acho que o que aprendi é que assim que você faz uma previsão bem-sucedida, evite fazer outra”, disse Moore. “Eu evitei oportunidades de prever os próximos 10 ou 50 anos.”
Mas ele ficou surpreso por quanto tempo ela provou estar basicamente correta?
“Oh, estou assombrado”, ele disse. “A previsão original era para 10 anos, o que já achava exagerado. Isso representava passar de cerca de 60 elementos em um circuito integrado para 60 mil –uma extrapolação mil vezes maior ao longo de 10 anos. Eu achava isso radical. O fato de algo semelhante estar ocorrendo há 50 anos é realmente impressionante. Você sabe, há todo tipo de barreiras que víamos que impediriam dar o próximo passo, e de uma forma ou outra, ao nos aproximarmos, os engenheiros encontravam um modo de contorná-las. Mas algum dia vai parar. Um crescimento exponencial como esse não dura para sempre.”
Mas foi um crescimento exponencial e tanto. Ao iniciar o evento, o presidente-executivo da Intel, Brian Krzanich, resumiu onde a Lei de Moore nos levou. Se olharmos para o microchip de primeira geração da Intel de 1971, o 4004, e o mais recente chip da Intel atualmente no mercado, o processador Core i5 de quinta geração, ele disse, é possível ver o poder da Lei de Moore em ação: o mais recente chip da Intel oferece 3.500 vezes mais desempenho, é 90 mil vezes mais eficiente em energia e seu custo é cerca de 60 mil vezes mais baixo.
Colocando de outro modo, Krzanich disse que os engenheiros da Intel fizeram um cálculo aproximado do que aconteceria caso um Fusca da Volkswagen de 1971 tivesse melhorado na mesma taxa que os microchips segundo a Lei de Moore: “Aqui estão os números: (Hoje) você poderia rodar com aquele carro a 480 mil km por hora. Você rodaria 3,2 milhões de quilômetros com um galão (3,7 litros) de gasolina., e tudo isso por apenas US$ 0,04! Bem, mesmo assim você ficaria preso no congestionamento na (Via) 101 para chegar aqui esta noite, mas, em cada abertura, você avançaria a 480 mil km/h!”
“Bem”, disse Moore, “eu vinha olhando para os circuitos integrados –-eles eram realmente novos naquela época, tinham apenas poucos anos-– e eram muito caros. Havia muita discussão sobre o motivo por que nunca seriam baratos, e comecei a ver, da minha posição como chefe de um laboratório, que a tecnologia iria em uma direção onde colocaríamos mais e mais coisas em um chip e que tornaria os eletrônicos menos caros. (…) Eu não tinha ideia que seria uma previsão relativamente precisa, mas eu sabia que a tendência geral era naquela direção e precisava apresentar um motivo para ser importante baixar o custo dos eletrônicos”.
Como foi que ele se interessou em ciência?
“Meu vizinho tinha um kit de química e podíamos fazer explosivos”, ele disse. “Naquela época, kits de química tinham algumas coisas bem legais, e eu decidi na época que queria ser químico, sem saber exatamente o que faziam, e prossegui com meu trabalho em um laboratório doméstico por algum tempo. Chegou ao ponto onde estava produzindo nitroglicerina em pequenas quantidades e a transformando em dinamite. (…) Algumas poucas gramas de dinamite resultavam em um fogo de artifício maravilhoso. Isso realmente despertou meu interesse. Não dá para fazer isso hoje, mas há outras oportunidades. Eu vejo para o que alguns dos meus netos estão fazendo, por exemplo, com robótica e coisas assim. São espetaculares. Eles realmente estão fazendo muito progresso.”
Olhando para a Lei de Moore e o poder da computação que ela guiou, eu pergunto a Moore qual ele acha que foi sua contribuição mais importante nos últimos 50 anos.
“Uau!” ele disse. “A simples proliferação do poder de computação. Nós vimos apenas o início do que os computadores farão por nós.”
Como assim?
“Oh, eu acho que, de modo incremental, estamos vendo eles assumirem oportunidades que tentamos fazer sem eles antes e não fomos bem-sucedidos”, ele acrescentou. “É meio que uma evolução em inteligência de máquina, se quiser, e isso não está acontecendo de uma só vez. Para mim, está ocorrendo em todo um conjunto de incrementos. Eu nunca imaginei que veria automóveis autônomos circulando pelas ruas. Não faz muito tempo que lançaram uma proposta para ver quem construiria um carro que pudesse cruzar o Deserto de Mojave até Las Vegas, saindo de algum lugar no Sul da Califórnia, e várias equipes de engenharia de todo o país se dedicaram a isso. Ninguém conseguiu avançar mais de 300 metros sem que houvesse um problema. Dois anos depois, eles fizeram a viagem completa de 40 quilômetros pela trilha no deserto, o que achei ter sido um grande feito, e depois, em um piscar, eles estavam circulando pelas avenidas. Eu acho que veremos avanços incrementais como esse em uma variedade de outras áreas.”
Eu perguntei a Moore, cujos próprios microprocessadores parecem tão aguçados quanto sempre foram, se ele teme que as máquinas possam começar a substituir tanto a mão de obra operária quanto a de colarinho branco em uma escala que possa significar o fim do trabalho para muita gente?
“Não me culpe!” ele exclamou. “Eu acho que é muito provável que continuaremos vendo isso. Por vários anos, eu disse que éramos uma sociedade de duas classes separadas pela educação. Eu acho que veremos a prova de parte disso agora.”
Quando foi o momento em que ele chegou em casa e disse para sua esposa, Betty: “Querida, eles batizaram uma lei com meu nome?”
Moore respondeu: “Pelos primeiros 20 anos, eu não conseguiu dizer Lei de Moore. Era embaraçoso. Não era uma lei. Finalmente, eu me acostumei, de modo que agora posso dizer de modo sério”.
Diante disso, há algo que ele gostaria de ter previsto –-como a Lei de Moore-– mas não previu?
“A importância da Internet me surpreendeu”, disse Moore. “Parecia que seria apenas outra rede de comunicação menor que resolveria certos problemas. Eu não percebi que ela abriria todo um universo de novas oportunidades, mas ela abriu. Eu gostaria de ter previsto isso.””
Fonte: UOL, Adrenaline, OlharDigital