Por que os Estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste tiveram maior aumento na conta de luz?
Aprovado no final de fevereiro pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o reajuste da conta de luz nos Estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste foi, em média, 23,2 pontos percentuais superior do que no Norte e Nordeste. Enquanto nas primeiras três regiões o aumento da tarifa foi de em média 28,7%, nas outras duas o aumento médio foi de 5,5%.
Das 58 concessionárias que reajustaram a tarifa no país, duas gaúchas estão entre as que tiveram os cinco maiores aumentos. O maior reajuste do Brasil foi da AES Sul, de 39,5%. Já a RGE teve a quinta maior alta tarifária do país, de 35,5%. Apenas uma empresa do Estado teve aumento inferior à média nacional: a CEEE. Enquanto o reajuste médio nacional foi de 23,4%, o da estatal gaúcha foi de 21,9%.
Mesmo assim, o reajuste foi muito superior aos de empresas como a Companhia Energética de Pernambuco (Celpe), de 2,2%, e a Companhia de Energética do Rio Grande do Norte (Corsen), de 2,8%, os dois menores aumentos tarifários do país.
Para explicar o porquê consumidores do Sul, Sudeste e Centro-Oeste tiveram maior impacto no bolso, Zero Hora conversou com Paulo Steele, analista que atuou por cerca de cinco anos na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), no desenvolvimento do cálculo dos custos para concessionárias, e atual consultor na empresa TR Soluções.
Embora dependente da autorização da Aneel, os reajustes funcionam para manter a competitividade das concessionárias, e é feito com base nas despesas de cada empresa. Como essas companhias têm diferentes contratos de compra e distribuição de energia, os gastos variam, o que explica a diferença entre os reajustes.
No caso das empresas das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, Steele explica que os clientes sentiram o impacto do aumento de três custos no último ano: da geração em Itaipu, da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e da compra de energia. Foi a alta dessas três despesas que contribuiu para reajustes superiores aos do Norte e do Nordeste.
Itaipu, que fornece energia elétrica às regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, teve aumento de 46% no custo de geração de energia no último ano. O crescimento foi impulsionado pela alta do dólar (por ser uma empresa binacional, a energia da geradora é comercializada na moeda) e pela fata de chuva.
O segundo fator que contribuiu para o reajuste desigual entre as regiões foi a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). A conta é um fundo setorial criado por lei em 2002, usado para promover a competitividade de usinas que utilizam fontes alternativas de energia — como eólica, biomassa e carvão — e a “universalização da energia elétrica no país”, conforme a Aneel.
O problema, de acordo com Steele, é que, quando a CDE foi criada, a conexão entre as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste com o Norte e o Nordeste era muito fraca, havendo pouca transmissão de energia. Por isso, foi estabelecida uma diferenciação na hora do pagamento da CDE. O analista explica que, como naquela época a energia não chegava ao Norte e Nordeste, ficou estabelecido que as empresas dessas regiões pagariam apenas 5% da conta, enquanto as companhias das outras localidades bancariam 95%.
Com o aumento de mais de 1.000% no valor desta conta, que não terá mais aporte do Tesouro Nacional em 2015, ela acabou pesando no bolso dos consumidores do Sul, Sudeste e Centro-Oeste.
Steele explica que, quando a a CDE foi criada, havia justificativa técnica para que os estados do Norte e Nordeste pagassem menos, já que eles não recebiam energia de outras localidades e a maior parte do fundo servia para financiar a geração de energia a carvão. O cenário atual, no entanto, pede uma redivisão de gastos com o fundo entre as regiões, segundo o analista.
— Hoje, além de haver conexão forte entre as regiões, que possibilita a transmissão de energia, a maior parte da CDE serve para financiar políticas sociais como o Programa Luz para Todos e a Tarifa Social de Energia Elétrica — informa Steele.
Para alterar as cotas de pagamento da conta, no entanto, é preciso alterar a lei que as estipulam, explica o analista.
O terceiro fator que impactou na conta dos consumidores do Sul, Sudeste e Centro-Oeste foi o custo da compra de energia. Steele explica que muitas das concessionárias dessas regiões viram seus contratos de compra de energia a longo prazo (para 20 ou 30 anos) no final em 2013, sem que o governo realizasse leilões de reposição desses acordos. Isso obrigou as empresas a comprar energia em contratos de curto prazo (para até seis meses) por um valor mais elevado, o que refletiu em reajustes salgados.
Fonte: Zero Hora