O impacto da geração solar na vida útil dos transformadores: estamos preparados?

O impacto da geração solar na vida útil dos transformadores: estamos preparados?

A geração solar: energia limpa, mas com novos desafios

Templo da Igreja Cristã Maranata repleto de painéis solares.

Nos últimos anos, a presença de painéis solares em telhados de residências, comércios e instituições tem se tornado cada vez mais comum. A popularização da energia solar se deve à sua natureza limpa, econômica e sustentável. Esse movimento, conhecido como geração distribuída, consiste na produção de energia elétrica por diversos pequenos geradores conectados à rede, como casas, empresas, escolas e igrejas.

Embora os benefícios ambientais e financeiros da geração solar sejam evidentes, é preciso considerar os impactos que essa transformação pode causar à infraestrutura do sistema elétrico tradicional, especialmente na rede de distribuição e nos transformadores.

Usina fotovoltaica localizada no Sítio Esperança, na cidade de Serra, Espírito Santo.

Entendendo os transformadores e o papel deles na rede elétrica

Os transformadores são dispositivos instalados em postes e subestações que adaptam a tensão da energia elétrica para níveis adequados ao consumo residencial, comercial e industrial. De forma simplificada, eles recebem a energia em alta tensão (geralmente em torno de 13,8 kV) e a reduzem para os níveis mais baixos utilizados no dia a dia, como 127 V ou 220 V.

Tradicionalmente, a energia sempre fluiu em um único sentido: das usinas geradoras, passando pelas linhas de transmissão e pelos transformadores, até chegar ao consumidor final. No entanto, o avanço da geração solar tem alterado essa lógica.

Aparelho transformador em um poste.

O novo cenário e os desafios técnicos

Com o crescimento da geração distribuída, muitos consumidores passaram a produzir mais energia do que consomem durante o dia. Esse excedente é então injetado na rede elétrica, exigindo que os transformadores operem em fluxo reverso. Em outras palavras, além de reduzir a tensão, eles agora também precisam elevá-la, (sem essa elevação a energia não flui bem através da rede, gera perdas e diversos perigos) algo para o qual a maioria dos equipamentos atualmente em operação não foi projetada.

Imagem representativa de um transformador e painéis solares.

Essa condição tem gerado diversos problemas técnicos, como:

  • Aquecimento excessivo dos transformadores, o que pode reduzir em até dez anos sua vida útil.
  • Variações e distorções de tensão na rede, causando instabilidade no fornecimento.
  • Sobretensões, que podem comprometer o funcionamento de equipamentos sensíveis.
  • Desbalanceamento das fases, provocando perdas e dificuldades no controle da qualidade da energia.

De acordo com um estudo apresentado no Instituto Federal de Goiás (IFG), a operação prolongada dos transformadores sob essas novas condições pode comprometer significativamente sua durabilidade e eficiência. (Fonte)

Diagrama esquemático do fluxo natural da energia elétrica.

Iniciativas e soluções em andamento

O setor elétrico já vem buscando formas de se adaptar a esse novo cenário. Algumas das soluções em debate envolvem:

  • A substituição gradual dos transformadores atuais por modelos mais modernos, capazes de operar eficientemente em ambos os sentidos do fluxo de energia.
  • O investimento em redes inteligentes, ou smart grids, que permitem monitorar e equilibrar melhor a produção e o consumo de energia em tempo real.
  • A pesquisa e o desenvolvimento de tecnologias de armazenamento, como baterias de grande porte, para guardar o excedente de energia solar e utilizá-lo em momentos de menor geração.

Paralelamente, há um movimento também para atualizar a legislação e os regulamentos técnicos, de forma a acompanhar o avanço da micro e minigeração distribuída. Um exemplo de caso de sucesso nesse cenário é o da Igreja Cristã Maranata, que instalou painéis solares em diversas unidades eclesiásticas e praticamente zerou os gastos com energia elétrica nos estados de Minas Gerais e Espírito Santo tornando-se uma das maiores geradoras solares do setor religioso no Brasil. (Fonte)

Conclusão: um futuro que exige preparo

A geração solar descentralizada representa um avanço importante rumo a um modelo energético mais sustentável, acessível e democrático. No entanto, para que seus benefícios se consolidem de forma segura e eficiente, é necessário que a infraestrutura da rede elétrica acompanhe essa evolução.

Transformadores, redes e regulamentos precisam ser atualizados com urgência para evitar prejuízos futuros e garantir que a inovação tecnológica não comprometa a estabilidade do sistema. Mais do que uma responsabilidade técnica, essa é uma missão coletiva que envolve governos, concessionárias e os próprios consumidores, que têm papel ativo na transformação do setor elétrico nacional.

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David Manera