Investigação na Eletrobras se torna cinco vezes maior
Centenas de profissionais investigam milhares de pessoas sobre irregularidades na
estatal
A indicação da ex-ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) Ellen Gracie para a composição do Comitê Especial que acompanha as investigações de irregularidades dentro da Eletrobras trouxe novas proporções ao trabalho que vinha sendo feito por advogados e especialistas da área tecnológica. Com o status de quem já era integrante do Comitê independente da Petrobras, a ministra determinou a ampliação do escopo das investigações também na Eletrobras, o que resultará em um trabalho cinco vezes maior do que aquele planejado inicialmente.
Mais de 100 profissionais investigam, neste momento, algo na casa de milhares de pessoas que possam ter informações sobre irregularidades na estatal elétrica. Além da ampliação no número de pessoas envolvidas no trabalho, incluindo investigadores e investigados, a reportagem do Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado, apurou que as atividades também abrangerão novas empresas, casos das usinas de Teles Pires e São Manoel.
As investigações tiveram início em junho, ainda com a coleta de dados e reuniões de percepção das operações da Eletrobras, entre outras atividades. Em setembro, com a indicação de Ellen Gracie, os trabalhos foram ampliados. Se em princípio as investigações deveriam focar as obras das usinas Angra 3, Jirau, Belo Monte e Santo Antonio, agora a lista conta também com as usinas Teles Pires, São Manoel, Mauá 3, Simplício e Tumarin. O foco da investigação está na relação entre empresas controladas pela Eletrobras e as construtoras citadas nas investigações da Polícia Federal no âmbito da Operação Lava Jato.
“A investigação dentro da Petrobras teve início antes e, por isso, a Ellen Gracie, já com a experiência das atividades em curso naquela empresa, solicitou a ampliação do escopo de apuração dentro da Eletrobras”, afirmou uma fonte com conhecimento sobre o andamento das investigações e que pediu para não ser identificada. Procurada para comentar o assunto, a ministra Ellen Gracie não foi localizada para conceder entrevista.
Como o prazo de elaboração do relatório final foi mantido para março de 2016, as empresas envolvidas nas atividades de investigação renegociaram novas condições contratuais com a Eletrobras. Há, neste momento, aproximadamente 100 pessoas envolvidas nessas investigações. Entre elas, estão advogados do escritório anglo-americano Hogan Lovells e do brasileiro WFaria Advogados, especialistas em tecnologia das empresas Control Risk e Kroll e funcionários da própria Eletrobras.
O número de pessoas que possa ter alguma informação relevante ao objeto da investigação, por sua vez, chegou à casa dos milhares, segundo apurou o Broadcast. “Todo o material necessário já foi coletado, os dados são cruzados e a partir dessa etapa surgem diversas informações. É um trabalho de garimpo”, afirmou a fonte.
Como o prazo é curto, diversas atividades estão ocorrendo em paralelo. Se por um lado especialistas da área tecnológica rastreiam palavras que podem sugerir irregularidades, caso das expressões “café”, “cafezinho” e “Pixuleco”, além dos nomes das construtoras citadas na Lava Jato, entre outros temas, aos advogados compete ouvir pessoas de diferentes níveis hierárquicos dentro da Eletrobras e das SPEs (sociedades de propósito específico) responsáveis pelas usinas sob investigação.
A tarefa dos investigadores é identificar se houve alguma irregularidade, quem são as pessoas por trás de tais irregularidades, qual foi o impacto de tal prática à Eletrobras e quais medidas seriam necessárias para evitar que a situação volte a se repetir. O resultado das buscas tem sido compartilhado semanalmente com o Comitê Especial, este formado pela ministra Ellen Gracie, pelo ex-diretor da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) Durval Soledade e pelo representante dos acionistas minoritários no conselho fiscal da Eletrobras, Manuel Jeremias Leite Caldas.
Mudanças
A diretoria da Eletrobras não concedeu entrevista para falar sobre o tema. Em nota, a estatal se limitou a informar que a investigação está em andamento e que, ao término das atividades, “a empresa informará ao mercado, por intermédio dos canais competentes, o resultado.”
Em função disso, ainda não é possível determinar se o andamento das investigações resultou em medidas práticas dentro da estatal do setor elétrico. As investigações feitas pela Polícia Federal, contudo, já causaram o desligamento do então presidente da Eletronuclear, Othon Luiz Ribeiro da Silva. O almirante foi preso preventivamente em 28 de julho, quando foi deflagrada a Operação Radioatividade. O diretor de Planejamento e Engenharia da Eletronorte, Adhemar Palocci, irmão do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, também foi afastado da companhia.
Embora a Eletrobras tenha participação em mais de 150 SPEs, o trabalho de investigação ficou concentrado em algumas das empresas de maior porte e que potencialmente movimentem contratos mais expressivos. Diante da dimensão do trabalho, o cronograma de conclusão do relatório foi postergado de outubro para dezembro, e então para o final do primeiro trimestre de 2016.
A apresentação do relatório de investigação pode ser uma etapa fundamental para que a Eletrobras conclua a elaboração dos resultados financeiros de 2015 e, ao mesmo tempo, consiga entregar o formulário 20-F para a Securities and Exchange Comission (SEC, equivalente à CVM nos Estados Unidos). O documento referente ao ano de 2014, que deveria ter sido entregue no final de abril passado, ainda não foi encaminhado à autoridade máxima do mercado de capitais norte-americano.
Ao anunciar a postergação da entrega, a Eletrobras atribuiu o atraso à necessidade de “adotar providências adicionais para atendimento das normas de auditoria aplicáveis em relação à jurisdição norte-americana”. Naquele momento, as investigações da Lava Jato já indicavam o risco de irregularidades dentro da estatal do setor elétrico.
O presidente do Ibracon (Instituto dos Auditores Independentes do Brasil), Idésio Coelho, explica que a SEC não aceita a apresentação de formulários com ressalvas. Dessa forma, a auditoria externa, feita pela KPMG, não poderia adotar tal prática que é comum no Brasil.
Cabe à auditoria dar aval às demonstrações contábeis anuais das empresas brasileiras. Além disso, é papel da auditoria detectar eventuais inconsistências entre os dados apresentados no 20-F e as demonstrações financeiras anuais. Como o balanço anual deve ser publicado até o final de março, o prazo de elaboração do relatório dos investigadores não pode ser postergado.
Fonte: R7