Balanço geral do leilão de Libra
Um consórcio formado por Petrobras e mais quatro empresas venceu nesta segunda-feira (21), o leilão do Campo de Libra, a maior reserva de petróleo conhecida do Brasil. Foi o primeiro prevendo a exploração de petróleo e gás natural na camada pré-sal sob o regime de partilha.
Único a apresentar proposta, contrariando previsões do governo, o consórcio ofereceu repassar à União 41,65% do excedente em óleo extraído do campo – percentual mínimo fixado pelo governo no edital.
‘Bilhete de loteria’
Seis anos atrás, quando foi descoberto o petróleo na camada pré-sal da costa brasileira, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva qualificou o potencial energético como “um bilhete de loteria” que o Brasil tinha ganhado.
Isso foi, entretanto, antes do advento de novas fronteiras no campo da energia, como a exploração de gás de xisto nos EUA, uma alternativa que os analistas acreditam capazes de transformar o panorama energético mundial.
O especialista em América Latina da consultoria Eurasia Group, em Washington, Luiz Augusto de Castro Neves, diz que as recentes descobertas de petróleo e gás em outros países do mundo colocam o Brasil na posição de competir pela atenção dos investidores com economias que oferecem outras vantagens para as empresas que pretendem atrair.
É um ambiente global muito diferente daquele em que o governo brasileiro delineou as regras que esperava impor às companhias interessadas em participar do pré-sal, afirma o analista.
“Houve um excesso de confiança que gerou o modelo do pré-sal. Nos últimos três ou quatro anos, o mundo mudou”, ele disse.
“O Brasil ainda é um ator promissor no campo energético mundial, mas está tendo de adaptar um pouco as suas políticas a esse cenário menos favorável.”
Para Castro Neves, “cada vez fica mais claro que o pré-sal é um bilhete de loteria, mas com um prazo de validade”, compara. “Se você não tirar (o petróleo) do chão a tempo, pode ficar tarde demais.”
Protestos
Trabalhadores, sindicalistas, ambientalistas e representantes de movimentos sociais contrários à exploração da iniciativa privada organizaram protestos na frente do hotel Windsor, na Barra da Tijuca (Zona Oeste do Rio), local em que o leilão é realizado. Um dos grupos contra o leilão é o dos petroleiros, representado pelo Sindicato dos Petroleiros do Estado do Rio de Janeiro (Sindipetro-RJ) e pela Federação Nacional dos Petroleiros. O sindicato é contra a “entrega” pelo governo do óleo do pré-sal a corporações estrangeiras.
Repercussão do leilão
Embora tenha gerado opiniões divergentes, o leilão de Libra teve a falta de concorrência como o maior alvo de críticas, tanto no cenário nacional quanto no internacional.
Os pré-candidatos do PSB e do PSDB à Presidência da República, Eduardo Campos e Aécio Neves, respectivamente, criticaram tal falta de concorrência de grupos empresariais em participar do leilão.
O senador Aécio Neves (PSDB-MG) classificou a licitação de “enorme fracasso”, chegando a chamá-la de a maior “privatização da história brasileira”. Já o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, disse que a falta de disputa não foi boa para o país.
Numa ironia, o senador do PSDB considerou o ministro da Fazenda, Guido Mantega, como o “grande vencedor do leilão”. Isso porque os R$ 15 bilhões em bônus do consórcio que arrematou a área vão servir para o governo bancar o superávit primário. “A Petrobras paga o preço pela má condução da política econômica que levou ao recrudescimento da inflação. Obviamente, a partir de uma ação do governo junto à Petrobras por conta do controle do preço da gasolina, a empresa perde valor de mercado, perde competitividade.”
O especialista Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura, vê o leilão em si como um sucesso, mas também tem suas críticas.
“O primeiro sucesso foi o governo ter voltado a fazer leilão, e para isso ter conseguido derrubar uma série de liminares que tentavam impedir. Outro sucesso foi ter atraído empresas particulares e com isso construir um consórcio consistente”, ponderou Adriano Pires.
No entanto, ele fez questão de afirmar que leilão que só atrai um consórcio é um fracasso. “O grande derrotado foi o governo brasileiro que era dono de um bem muito valioso e entregou pelo mínimo”, disse.
Já a diretora da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Magda Chambriard, disse que “sucesso maior que este é difícil de imaginar”.
“A qualidade técnica que conseguimos reunir, com empresas como a Petrobras, que explora e produz 25% do petróleo em águas profundas do mundo e alterna recordes com a Shell, que também está no consórcio, vai entrar para a história do país”, disse a presidente da ANP.
A revista britânica “The Economist“, disse que o leilão foi decepcionante. Com o título “Preço barato”, a revista avalia que a presença de apenas um consórcio mostrou o fracasso do modelo escolhido pelo governo para desenvolver as reservas. “A falta de competição foi uma decepção após a euforia de seis anos atrás quando o presidente Lula, descreveu o pré-sal como um ‘bilhete de loteria premiado”. A revista lembra que o xisto foi tomando o lugar do pré-sal como perspectiva energética “mais importante do mundo”. Assim, diz a reportagem, o interesse privado desapareceu, provocando a ausência das gigantes como Chevron, Exxon, BP e BG.
Análise do resultado
Ótica negativa: sob o novo marco para a exploração do petróleo, aprovado em 2010, não se viu a participação maciça de empresas estrangeiras, como era a aposta de apenas alguns meses atrás.
Apenas um consórcio apresentou oferta e o governo vai receber o mínimo estipulado nas regras – um bônus de assinatura de R$ 15 bilhões mais 41,65% do petróleo produzido após descontados os custos de produção (o chamado lucro-óleo).
Ótica positiva: o resultado não foi simplesmente um “acordo de estatais” entre a Petrobras e suas equivalentes chinesas, como temiam alguns críticos, mas atraiu duas gigantes privadas do setor, a francesa Total e anglo-holandesa Shell, que juntas detêm 40% da empreitada.
Se o governo receberá pagamento mínimo pelo acordo, isso também quer dizer que o negócio é mais lucrativo para a Petrobras, um alívio para uma empresa com problemas de caixa e cuja capacidade de operar todas as bacias, como requer o modelo, sempre foi questionada pelos críticos.
Fontes: G1, Jornal O Globo, BBC Brasil e Exame