Consumo Industrial: Entenda as Tarifas de Energia para os Consumidores em Alta-Tensão

Introdução
Após tratarmos das tarifas aplicadas aos consumidores residenciais (Grupo B), agora abordaremos como funcionam as tarifas para os consumidores industriais do Grupo A — aqueles atendidos em tensões superiores a 2,3 kV ou por meio de redes subterrâneas. Devido ao elevado consumo energético das indústrias em comparação com os consumidores residenciais, é necessário considerar uma série de particularidades na elaboração da “conta de luz” desses consumidores. Seu potencial de impactar a rede elétrica é significativamente maior, o que exige uma análise mais criteriosa dos picos de demanda, horários de consumo e até mesmo do período do ano, como perríodos secos ou chuvosos, que afetam a disponibilidade de geração.

Em resumo, consumidores industriais não apenas pagam pela energia efetivamente consumida, como também devem contratar uma demanda máxima junto à distribuidora, garantindo maior confiabilidade tanto ao seu próprio fornecimento quanto ao de outros usuários conectados à mesma rede. O conhecimento detalhado sobre a formação da fatura e os hábitos de consumo possibilita a escolha da modalidade tarifária mais vantajosa, resultando em menores custos com energia elétrica. Neste texto, abordaremos os conceitos de curva de carga, demanda e consumo, horários de ponta e fora de ponta, além das modalidades tarifárias horossazonais verde e azul.
Curva de Carga, Demanda e Consumo
Ao se iniciar o estudo para o enquadramento tarifário de indústrias é necessário ter de posse a curva de carga, que mostra visualmente o comportamento do consumo energético ao longo do dia e dela são retirados os dados de consumo e demanda necessários no estudo do enquadramento tarifário.
A demanda representa a potência requisitada em um dado instante, medida em kW. Enquanto o consumo refere-se à potência efetivamente utilizada ao longo do tempo, ou seja, energia e portanto medido em kWh.

Para a composição da tarifa de um consumidor do Grupo A, a concessionária considera a curva de carga diária dividida em intervalos de 15 minutos, analisando 4 tipos principais de demanda para fins de faturamento:
- Demanda Contratada: Demanda de potência ativa a ser disponibilizada de forma contínua pela distribuidora conforme contrato, em valor e período pré-estabelecidos, sendo este valor atingido ou não pela unidade consumidora.
- Demanda Medida: Maior demanda de potência ativa verificada por medição – é a demanda máximo para a curva de carga dividida para cada 15 minutos e não deve ultrapassar a demanda contratada.
- Demanda Faturável: É a demanda de potência ativa a ser considerada para fins de faturamento.
- Demanda de Ultrapassagem: Parcela de demanda medida que excede a demanda contratada.
Achou confuso? Vejamos como essas demandas se relacionam na prática: ao analisar o ponto de maior demanda de sua curva de carga — demanda medida —, você contrata da concessionária um valor um pouco superior como margem de segurança, definindo a demanda contratada. Se, ao longo do mês, sua demanda real não ultrapassar o valor contratado, a demanda faturável será igual à demanda contratada, ou seja, você paga por essa reserva de potência, independentemente de usá-la totalmente ou não. Contudo, se a demanda medida exceder a demanda contratada, surge a demanda de ultrapassagem, e a demanda faturável passa a ser composta pelo valor contratado mais o excedente, que será cobrado com uma tarifa adicional (multa).
Então a indústria pode ficar sem energia se ultrapassar a demanda contratada? Não!. A distribuidora continuará fornecendo energia, mas a ultrapassagem resultará em penalidades financeiras. A tarifa de ultrapassagem só é aplicada quando a demanda medida ultrapassa em mais de 5% o valor contratado. No entanto, é importante destacar que, dado o elevado consumo das cargas industriais, variações bruscas e não planejadas podem comprometer a estabilidade do sistema, provocando quedas de tensão ou até falhas no fornecimento para consumidores próximos se a rede não estiver dimensionada para absorver tal sobrecarga.
Tarifação Horossazonal e Modalidades Tarifárias
A tarifação horossazonal recebe esse nome por considerar duas variáveis fundamentais: a hora do dia e o período do ano (seco ou úmido), com o objetivo de reduzir o consumo em momentos críticos — seja ao longo do dia, seja em épocas do ano com maior risco de escassez energética.
- Hora do dia: Esse fator impacta diretamente a composição tarifária e influencia a operação do maquinário industrial. As distribuidoras de energia definem uma janela de 3 horas consecutivas com maior demanda de energia, chamada horário de ponta, durante a qual o custo da energia é mais elevado. As demais 21 horas do dia constituem o horário fora-ponta. Essa diferenciação busca incentivar a redistribuição do consumo ao longo do dia e é amplamente utilizada tanto para fins tarifários quanto para o planejamento da operação do sistema elétrico. A CEMIG, por exemplo, define o horário de ponta como sendo das 17h às 20h.
- Período de chuvas: Devido à forte presença das hidrelétricas — fontes renováveis e de baixo custo — na matriz energética brasileira, a sazonalidade hídrica também influencia as tarifas. Durante o período seco (maio a novembro), a geração hídrica é reduzida, exigindo o acionamento de usinas térmicas, mais caras e poluentes. Já o período úmido (dezembro a abril) apresenta maior disponibilidade hídrica e, portanto, menor custo de geração.
Considerando essas variáveis, os consumidores do grupo A podem ser enquadrados em 3 tipo de modalidades tarifárias: convencional, horossazonal verde e horossazonal azul (obrigatório se a tensão de alimentação for maior que 69kV), sendo exigido um contrato com a distribuidora em todos os casos.

Tarifa Convencional
Modelo convencional muito parecido com o residencial. A tarifa é única para o consumo e única para a demanda, sendo a conta de energia composta por parcelas referentes ao consumo, demanda e ultrapassagem. A tarifa de ultrapassagem é na ordem de 2x a tarifa da demanda. Arbitrária a consumidores do grupo A cuja tensão de alimentação é menor que 69kV.
Tarifa Horossazonal Verde
Constituída de tarifa única para demanda de potência; tarifa de consumo de energia na ponta em período úmido e seco; tarifa de consumo de energia fora ponta em período úmido e seco. Arbitrária a consumidores do grupo A cuja tensão de alimentação é menor que 69kV.
Tarifa Horossazonal Azul
Constituída de tarifa de demanda para posto tarifário ponta e outra para o posto fora-ponta (sua principal diferença para a horossazonal verde); tarifa de consumo de energia na ponta em período úmido e seco; tarifa de consumo de energia fora ponta em período úmido e seco. Arbitrária a consumidores do grupo A cuja tensão de alimentação é até 69kV, se tornando obrigatória se ultrapassar.
Então como é feita a escolha?
Você provavelmente se perguntou por que não apenas usar a modalidade convencional, por ser a mais simples, ela é justamente a menos vantajosa por cobrar tanto a energia consumida quanto a demanda contratada em valores únicos, que não distinguem entre horários de maior ou menor carga do sistema elétrico: o consumidor paga o mesmo valor por um consumo feito às 3h da madrugada ou às 18h, horário em que o sistema costuma estar no pico de carregamento. Na prática, essa ausência de diferenciação elimina qualquer incentivo à gestão do consumo ao longo do tempo, tornando a tarifa convencional pouco atrativa do ponto de vista econômico para consumidores que teriam condições de melhor distribuir o consumo.
Em contraste, a modalidade verde oferece uma estrutura tarifária mais sensível aos horários. A energia elétrica é tarifada de forma diferenciada para os períodos de ponta e fora de ponta, o que já representa um incentivo direto à redução do consumo durante os horários críticos do sistema. No entanto, a demanda contratada segue sendo única para todo o período, ou seja, o consumidor é cobrado por uma única potência demandada máxima, independentemente de quando essa demanda ocorre. Essa estrutura simplificada é adequada para consumidores que não conseguem prever com precisão a demanda em cada horário, mas que têm capacidade de reduzir o consumo energético no horário de ponta, por exemplo, com a adoção de turnos ou controle parcial de carga.
Já a modalidade azul é a mais exigente em termos de gestão energética. Nessa modalidade, tanto a energia consumida quanto a demanda contratada são tarifadas de forma diferenciada para os horários de ponta e fora de ponta. Isso permite ao consumidor declarar demandas distintas para cada período e pagar tarifas mais elevadas no horário de ponta apenas se, de fato, utilizar capacidade instalada nesse intervalo. Assim, a tarifa azul se mostra vantajosa para unidades que operam com alto nível de controle sobre sua carga, como aquelas que podem adotar estratégias de deslocamento de consumo, automação de processos ou uso de sistemas de armazenamento de energia. Apesar de seu potencial de economia, a tarifa azul exige um acompanhamento mais preciso dos perfis horários de carga e da performance dos sistemas consumidores, o que pode demandar investimentos em gestão e monitoramento energético.
Conclusão
Diante do alto consumo de energia das indústrias, que representam grande parte do uso da rede elétrica, foram pensadas em formas de tarifação que incentivem o melhor uso da energia por parte destes grandes consumidores. As propostas tarifárias horossazonais azul e verde possuem caráter de distribuir de forma mais uniforme a curva de carga do consumidor industrial, pois altos picos de demanda representam riscos de confiabilidade à rede de alimentação mesmo em postos fora-ponta, obrigando a otimização da operação das cargas de forma a evitar picos de demanda em horários estratégicos.
Variações de cargas residenciais são muito sutis na rede elétrica frente a uma máquina de grande porte sendo acionado na industria, e por isso a conta de luz das residenciais não leva em consideração curvas de carga e os picos de demanda. Por outro lado, consumidores industriais devem considerar não apenas a quantidade total de energia consumida, mas também quando e com que intensidade essa energia é requisitada da rede. A escolha da modalidade tarifária adequada, portanto, torna-se uma ferramenta de gestão energética e financeira, permitindo ao consumidor alinhar seu perfil de operação às condições mais vantajosas de contratação, contribuindo simultaneamente para a eficiência do sistema elétrico nacional.
Referências
- Welllington Carlos Da Conceição. Curso de Extensão em Eficiência Energética. Aula 06: Eficiência Energética Industrial. Instituto Federal do Sudeste de Minas Gerais. Outubro de 2024.
- Canal Eng. Luis César Emanuelli. Sistema Tarifário de Energia Elétrica: Conceitos básicos, tarifa Azul Verde e Convencional. Disponível em: Sistema Tarifário de Energia Elétrica: Conceitos básicos, tarifa Azul Verde e Convencional – YouTube