A obrigatoriedade das normas técnicas brasileiras

Uma norma técnica nacional é a maneira mais direta de se criar um documento contendo requisitos ou boas práticas a partir do conhecimento de uma base de cidadãos que representam a sociedade, sem ter como intermediários representantes eleitos e que constituem o Poder Legislativo do Estado. Existe uma dúvida perene no tema normalização que diz respeito ao aspecto de obrigatoriedade do atendimento do conteúdo de um documento. Mesmo sem entrar no mérito no caso brasileiro do Código de Defesa do Consumidor, que determina claramente o atendimento de normas técnicas oficiais pelos produtos e serviços disponíveis ao consumidor (em seu sentido mais amplo), apenas a expressão constante em todas as normas técnicas que o documento tem caráter “normativo” já responde a essa dúvida. Constitui-se de uma norma da sociedade, obtida por consenso, por que não seria de atendimento obrigatório? O processo de sua elaboração, sim, é voluntário. A participação das pessoas e empresas é realmente livre, porém o produto de seu trabalho é uma “lei elaborada fora do legislativo”. No Brasil, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) foi reconhecida como o único foro brasileiro de normalização, pela Resolução do Conmetro nº 07, de 24 de agosto de 1992, portanto, o resultado de suas atividades (as normas técnicas) advém de um poder outorgado pelo Estado Brasileiro.

As normas técnicas da ABNT, em sua essência, definem as relações entre “comprador e fornecedor”, que devem ser entendidas em um sentido mais amplo do que simplesmente quem utiliza o produto. Um usuário de um produto é o “comprador” mais direto do processo, porém, um laboratório ou uma entidade ligada a um programa ou a esquemas de avaliação da conformidade, por exemplo, representam o “comprador” do produto, porém com o objetivo não da sua utilização, mas sim de avaliar as características de um produto.

A norma técnica da ABNT deve sempre ser entendida como um documento de consenso obtido na comunidade técnica do país e que especifica requisitos mínimos construtivos ou de desempenho. O processo de elaboração de uma norma representa a boa prática adotada pelas entidades internacionais e nacionais (de cada país). O processo de normalização adotado pela ABNT, a exemplo dos processos internacionais e estrangeiros, tem os seguintes objetivos:

  • Comunicação
  • Simplificação
  • Proteção ao consumidor
  • Segurança
  • Economia
  • Eliminação de barreiras comerciais

 

O princípio básico da normalização é sempre o consenso entre as chamadas partes interessadas, ou seja, aquelas que representam as personagens que tiram proveito de seu conteúdo para estabelecer e melhorar seu relacionamento técnico “pelo fato do produto ou do serviço”. Assim, o processo de elaboração de uma norma técnica deve ser transparente e representar os requisitos mínimos aplicáveis, sejam construtivos ou de desempenho. Isso significa que se um documento normativo não define determinado requisito considerado importante, não necessariamente é uma falha do documento, pode ser que não tenha havido consenso em sua elaboração. Esta tem sido uma das polêmicas na revisão da ABNT NBR 5410, porque ela não entra em mais detalhes sobre certos assuntos. Se não há consenso, é mais coerente deixar de fora do documento, a critério do usuário da norma, mesmo que seja um caso crítico, ressaltando-se, porém, em uma nota, por exemplo, de que devem existir análise e decisão adequadas.

O processo de desenvolvimento de um documento normativo se inicia a partir de uma demanda da sociedade (pessoa física, empresa, órgão público, regulamentador, associado ou não da ABNT). A pertinência do pedido e da demanda é analisada pela ABNT, a partir de regras estabelecidas pelo Conmetro. Se tiver mérito, será levada ao comitê técnico ou Organismos de Normalização Setorial (ONS) do setor para inserção no Plano de Normalização Setorial (PNS) da Comissão de Estudo pertinente. Se não houver comissão constituída, será criada uma Comissão de Estudos Especial (ABNT/CEE).

Os comitês técnicos e as ONS constituem a estrutura de “produção” de normas da ABNT. São os órgãos técnicos formados por comissões de estudos, em que as normas brasileiras são elaboradas e revisadas. A ABNT possui mais de 200 Comitês Brasileiros e quatro Organismos de Normalização Setorial, os quais são chamados genericamente de Comitês Técnicos. A ABNT desempenha o papel de gestora desse processo e não tem custos diretos na manutenção desses Comitês Brasileiros e das ONSs. Quem financia esses custos são as instituições setoriais referentes ao objeto dos Comitês e as empresas, entidades e pessoas ligadas ao desenvolvimento da normalização de cada tema. As Comissões de Estudo, que são compostas pelos interessados em fazer determinada norma brasileira, devem possuir representatividade dos consumidores, fabricantes e neutros envolvidos com o objeto da norma técnica.

O trabalho de todos os membros da comissão de estudos é voluntário e gratuito, ou seja, é um ônus público que a pessoa ou a organização que colocou seu representante na Comissão de Estudos tem com a Sociedade. A partir de um projeto de norma elaborado e aprovado em sua respectiva comissão de estudos, ele é colocado pela ABNT em consulta nacional por um período determinado, disponível para a avaliação da sociedade. A votação atualmente é realizada em meio eletrônico por um período normal de três meses, encaminhando-se os votos recebidos à respectiva comissão de estudos. Se aprovado, o projeto de norma é publicado como norma técnica. Em caso de não aprovação ou de sugestões de modificações, o projeto é modificado pela sua respectiva comissão e, se necessário, passa por nova consulta nacional. Caso não haja consenso na determinação de seu conteúdo, o projeto de norma pode ser cancelado. Após aprovação obtida no processo descrito, o Projeto de Norma aprovado é encaminhado à ABNT e homologado por ela, após o que passa a ser denominado de Norma Brasileira (ABNT NBR). A ABNT tem a obrigação descrita na Resolução do Conmetro de sempre tornar pública uma ABNT NBR.

Fonte: O Setor Elétrico