Cientistas propõem a construção de um muro para proteger geleiras na Antártica

O degelo de glaciares tem provocado um brainstorm constante em nível global, não por acaso. Afinal, o desprendimento de geleiras – decorrente do aquecimento global – pode levar a elevações no nível dos oceanos; de fato, mesmo uma subida hipotética de 1 metro poderia fazer desaparecer sob a água enormes porções de faixa costeira.

Embora ideias como proteger o planeta inteiro de raios solares com uma gigantesca cúpula ainda pareçam com soluções distantes várias décadas, uma nova proposta de pesquisadores da Universidade de Princeton tem sido considerada razoável por críticos e especialistas. Basicamente, trata-se de construir uma espécie de “muro” subaquático para proteger as geleiras das correntes de água aquecida advindas das porções mais quentes do globo.

O glaciar Thwaites

No caso, o projeto tem em vistas especificamente o glaciar conhecido como Thwaites. A enorme geleira da Antártica tem sido apontada por cientistas como um risco iminente, já que estaria prestes a se desprender da porção continental. Isso ocorre porque as correntes marítimas de água morna têm constantemente minado as porções inferiores do glaciar (confira a imagem abaixo) – o que, em um futuro razoavelmente próximo, poderia fazer com que o Thwaites se desprendesse do leito rochoso subjacente.

É precisamente a atuação dessas correntes aquecidas que os pesquisadores de Princeton pretendem refrear. Ao construir uma espécie de berma (não muito diferente dos acostamentos de rodovias) que cercasse a geleira, seria possível conter o fluxo de água morna; consequentemente, o Thwaites acabaria por se reconstruir naturalmente.

 

Ao construir um anteparo subaquático próximo à borda do glaciar, Thwaites os cientistas conseguiriam conter o fluxo de água aquecida que tem continuamente desprendido a geleira do leito de rochas. (Imagem: reprodução/The Cryosphere).

Além do “acostamento”, os pesquisadores também consideram duas outras soluções. Em uma versão mais ficção científica, a ideia seria construir realmente um muro que isolasse os glaciares, representando uma proteção de 100%; no caso da contenção subaquática, a efetividade seria de apenas 30%. Por fim, uma solução ainda mais modesta poderia envolver a instalação de estruturas pontuais no leito do oceano, a fim de que funcionassem como uma espécie de ponto de apoio para a geleira enquanto a base é naturalmente reformada.

A instalação nos limites do Thwaites, entretanto, seria uma escalada técnica e científica, de forma que a ideia seria iniciar por geleiras menores. “Os designs específicos que nós estamos considerando não estão nem remotamente próximos de uma implementação, e nós não estamos defendendo essa geoengenharia glacial para um futuro próximo”, disse Michael Wolovick, um dos responsáveis pelo estudo, em entrevista ao site Earther. Segundo ele, a ideia é iniciar um “processo de desenvolvimento iterativo” que poderia levar à solução.

Desafio de governança global

A despeito da seriedade da questão relacionada ao degelo polar, é fato que questões econômicas se ajuntariam aos desafios tecnológicos atuais para tornar ainda mais complexo um cenário no qual, por fim, seria possível construir o muro de Princeton. Conforme apontou o analista do Earther, trata-se de um desafio em potencial relacionado a questões de prioridade e de origem para os vultosos recursos que seriam implicados em semelhante projeto.

“Nós devemos gastar o nosso dinheiro protegendo as costas enquanto o Oeste [dos EUA] queima como uma batata frita ou enquanto a região africana de Sahel é consumida pelo [deserto do] Saara?”, questiona o autor. Ademais, seria também necessário saber por onde começar, já que a configuração física do planeta determina que alguns glaciares tenham efeito mais acentuado sobre regiões específicas do globo.

Problemas globais igualmente urgentes como a expansão do Deserto do Saara sobre regiões africanas tornam a aplicação de soluções como o muro glacial em um verdadeiro desafio de governança. (Imagem: reprodução/Wikimedia Commons).

Caso não se contenha a emissão de gases geradores do efeito estufa, entretanto, é certo que algo precisará ser feito. “Ainda que esse projeto ainda resida no campo da fantasia, algum dia ele pode se tornar a única alternativa”, disse a geóloga Andrea Dutton, em entrevista ao referido site. Em suma, se não é possível agir proativamente, de forma a conter o aquecimento global, algum dia será necessário administrar um tratamento puramente sintomático a um planeta moribundo.

 

Fonte: CanalTech